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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Fila de Espera

Realidade inevitável. Estamos mergulhados dos pés a cabeça numa longa fila de espera, existencial, empírica. Sentados na antessala da morte aguardando nosso inexorável chamado. Não importa o que pensamos, quem fomos ou o que somos. Não importa nossos predicados. A morte não se rende, é insensível a apelos. Não aceita desculpas, suborno, súplica. Não assina e nem respeita contratos, não tem preço. Incorruptível possui regras próprias que cumpre a risca. A morte não negocia com humanos.

Independente de qualquer coisa permanecemos nesta fila durante um tempo, uns mais outros menos. Ninguém tem a mínima vontade de ser o primeiro, pelo contrário, todos estão dispostos a ceder a vez. Eu e você engrossamos esta fila e dela somos a expressão viva. Cada um de nós é um candidato em potencial pois de fato, a morte vai nos arrebatar. 

Posso ser chamado agora, amanhã, logo mais ou daqui a muitos anos, assim como você. Não importa a idade, as chamadas são aleatórias. A morte tem estilo, gosta de surpreender. Estamos naturalmente atados a este destino. Enquanto aguardamos vemos com pesar pessoas a caminho, doentes, definhando-se, sendo engolidas com espantosa voracidade e precisão. 

Em linhas gerais elas somem de repente, desfilando a bordo de um esquife ou sob o potente calor de uma cremação, prostradas, indiferente as nossas lágrimas, aos nossos sentimentos. Isso sem contar aquelas que partem antes de nascer ou que misteriosamente evaporam, nem os corpos são encontrados.

Começamos a morrer desde que nascemos. Somos fisicamente mortais e esta fatalidade atesta as limitações da medicina cujo objetivo principal é aliviar o sofrimento mantendo e prolongando a vida. Somos vulneráveis ao tempo. Somos um corpo sensível aos processos químicos da matéria e num dado momento vamos sucumbir independente da nossa vontade. No momento da morte o que menos conta somos nós.

A fila de espera que me refiro não é tangível, foge aos sentidos mais densos. Encontra-se subterfugiada no subconsciente figurando-se em manifestações palpáveis, criando uma notável bifurcação, um inexplicável duplo sentido. Está implícita naquilo que embora necessário negligenciamos. 

Ficamos mais próximos do portão de embarque quando não nos cuidamos e violamos o protocolo básico gentilmente sugerido pela vida. Devemos nos conscientizar que a mãe terra nos acolhe por um determinado período e que compulsoriamente restituímos o que a ela pertence envolvendo-nos em seu seio. Lei imutável da natureza. Desfecho muito estudo mas ainda pouco compreendido e aceito pelo homem biológico.

Se vamos morrer então devemos viver. É razoável sorrir, é necessário amar. A morte implica vida e vida implica morte. Existem pessoas que estão mortas, respirando e pensando, trabalhando e agindo. Abatidas ou depressivas, infelizes e perturbando o semelhante. Elas já partiram e não sabem, já saíram da fila de espera, morreram efetivamente. Outras vivem, procuram fazer o bem pelo bem, sem levar vantagens, se ajudando mutuamente. Criam vida além da vida. Vivem, são vida em abundancia independente da fila, da espera, do chamado da morte.

Caminhemos de cabeça erguida pelas virtudes e não pelo orgulho das transitórias posses materiais. Quando a fila andar e ela anda continuamente, devemos olhar com cautela onde pisamos. O trajeto é sinuoso e devemos respeitar os códigos e os limites da existência. Cada passo pode representar e se tornar vida ou morte, alegria ou dor. Quem caminha somos nós e podemos optar pelo certo ou pelo errado, sempre. A fila se movimenta até quando dormimos, ela não descansa, não dá trégua é objetiva e mortífera.


Caminhemos com consciência e retidão e mesmo temerosos devemos projetar dignidade. Devemos reproduzir vida pela vida na imprevisível e enigmática fila de espera da morte.



Waldir José

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